Cinco motivos para ler poesia hoje

A poesia é uma linguagem artística que se materializa nos textos chamados líricos, que compõem um gênero literário presente na história humana e na Literatura através dos séculos. Há vestígios de poesia antes mesmo de a escrita nascer, e a oralidade é parte importante desse processo de criação poética – um grande exemplo disso é uma das mais importantes epopeias da Grécia Antiga, a Odisseia, de Homero.

O formato do poema costuma ser usado para comunicar ideias e sentimentos com ênfase na estética, na musicalidade, e poetas se valem dos recursos sintáticos, semânticos e fonéticos para compor suas obras. Por vezes, as rimas são empregadas nos versos para conferir ainda mais ritmo aos textos, e também é muito comum ver poemas serem musicados – aliás, as letras das canções são, também, poesia!

Houve um tempo em que o poema era um tipo de de arte literária bastante valorizado. Hoje, a estrela da Literatura é o romance, a ficção de modo geral, que precisa de muitas páginas e um texto longo para transmitir uma mensagem e suscitar uma reflexão. É claro que poemas também podem ser bastante extensos, mas, grosso modo, podemos dizer que o poema comunica com mais eficiência, por não precisar explicar muita coisa; isso acontece muito nos haikais, os poemas curtos tradicionais do Japão.

Sou suspeita para falar de poesia? Claro que sim. Afinal, lancei em dezembro o livro Poemas Mudos, meu primeiro livro solo e a primeira publicação tradicional da Editora Mil Palavras por Dia (que você pode adquirir aqui). Foi então que me descobri poeta, e passei a perceber mais nitidamente como nossa sociedade precisa desse olhar mais lírico e sensível para as coisas. A poesia, e mais especificamente o poema, é a forma que a alma encontra de se derramar sem muita justificativa.

No entanto, tenho a impressão de que o poema muitas vezes é tratado como um gênero “esquecido”, ou uma forma inferior de literatura. Como poeta, preciso combater esses estereótipos e mostrar que ler poesia é algo que nos engrandece e nos ajuda a entrar em contato com partes nossas que dormem quando estamos despertos.

Por isso, resolvi reunir aqui cinco motivos para ler poesia hoje!

1. Entretenimento e reflexão em poucas palavras

Poemas podem ser extensos, mas é bem comum encontrarmos poemas mais curtos e que podem ser lidos “em uma sentada”. Hoje, nosso tempo é escasso, e muitas vezes deixamos de ler por causa disso, ou por achar que não conseguiremos nos comprometer com a leitura de x páginas por dia. A poesia é uma excelente solução para quem deseja ler mais, porém não tem muito tempo: pode-se ler um poema no horário do almoço, e digeri-lo ao longo da sobremesa e do café da tarde…

2. Alívio para a alma cansada

Ler um poema é uma atividade prazerosa, que entretém e ajuda a desanuviar a mente. Em tempos de isolamento, pandemia, desgraças a todo momento, esse é um dos motivos pelos quais muitas pessoas recorrem à leitura: escapar das tristezas. Embora muitas vezes exprimam sentimentos tristes e denunciem a realidade, os poemas são possibilidades mais lúdicas e permitem que nos conectemos com emoções duras sem necessariamente sentir essa dureza. Há versos que tratam de assuntos delicados, como morte e injustiças sociais, mas que são de uma leveza ímpar. Já sentiu isso ao ler um poema triste? Por aqui é bem comum sentir que os fardos da vida se tornam menos pesados quando os vemos refletidos em um poema, porque não estamos sós na tristeza e no desalento, porque há quem compartilhe a dor conosco.

3. Leituras que não se esgotam

Quando chegamos ao final de um livro de prosa, a história acaba e ali a leitura se encerra. É claro que um livro não se esgota ao fim da narrativa, mas é difícil termos tempo de reler tudo aquilo que já lemos e nos causou impacto ou nos marcou de alguma maneira. Com a poesia, a releitura é uma possibilidade sempre presente, e a cada vez que entramos em contato com o mesmo poema, é como se estivéssemos lendo algo inédito. Eu tenho o hábito de ler um poema por dia, de autoras e autores que já fazem parte da minha estante, e a cada releitura descubro nuances de poemas que até já sei de cor. Que tal experimentar também?

4. Poemas também são música

Como já disse no início do texto, as canções são poesia musicada. Ouvir um poema cantado é incrível, mas você já parou para ler as letras de suas músicas preferidas? Canções como Rosa de Hiroshima, de Ney Matogrosso, Canção amiga, de Milton Nascimento, e Que o Deus venha, de Cássia Eller, são adaptações de poemas, e há muitas outras canções inspiradas em poesias famosas. Também é possível encontrar declamações de poemas consagrados em vídeos no YouTube, como esse aqui, Se eu fosse eu, da Clarice Lispector. Assistir a vídeos assim é uma maneira de estar em contato com a poesia mesmo quando não podemos ler.

5. Jovens poetas com quem podemos interagir

A poesia está ganhando cada vez mais espaço nas redes sociais. Jovens poetas como Ryane Leão, Clarice Freire, Lucas Lins, Ana Clara de Vitto e Angelica Freitas estão sempre postando seus poemas e interagindo com os seguidores. Suas obras refletem os tempos em que vivemos, dialogam com as inseguranças da vida no século XXI, denunciam realidades e revelam com beleza e humor as experiências de quem habita esse país-Brasil, hoje. Acompanhar o trabalho dessa galera é muito importante para fortalecer a presença de poetas contemporâneos na Literatura.

A poesia nos conecta e nos liberta, é atemporal e utilíssima em sua inutilidade. É necessidade para abstrair e força para seguir em frente. Poesia é alimento, acalanto, luz e fôlego no tormento.

Encerro esse post com um dos meus poemas do livro Poemas Mudos, para você, de fato, ler poesia, hoje!

Dualidade

Um lado dorme, insuspeito.
O outro observa, aflito, atento
sem refletir
ou parar: tempo é moeda de urgência.

Um lado se revira no espaço
reduz o passo
busca terra para firmar raízes.

O outro quer ser ventania
revirar paisagens e causar explosões no céu.

Enquanto um lado se encanta com as distrações
o outro é pura indagação.

Duas partes de mim
que se fundem
nessa coisa-alma.

Tão múltipla,
tão una.


Foto de mauRÍCIO SANTOS, no Unsplash. Poema Esses poetas, de Alcides Villaça